Fausto Brites
Com registro de ao menos três mil visitantes nos fins de semana atraídos bela exuberância da natureza emoldurada pelos portentosos Morro do Chapéu, Morro do Paxixi e Morro Azul, com o não menos importante Rio Aquidauana, o distrito aquidauanense de Coronel Camisão, na Estrada Parque de Piraputanga (formada também pela localidade do mesmo nome e por Palmeiras, este, pertencente ao município de Dois Irmãos do Buriti), vem ganhando cada vez mais a atenção pelo seu potencial nessa rota turística. O setor imobiliário, com cinco loteamentos e 750 terrenos onde estão havendo construções residenciais, cresce significativamente e empreendimentos estão sendo implantados na região fazendo com que o poder público de Aquidauana e o governo do Estado façam estudos de mais investimentos em infraestrutura e acessibilidade que os moradores, um total de 1.380 pessoas, esperam ansiosos. Entre esses empreendedores, quatro mulheres se destacam seja pela visão de futuro, como em função do trabalho que desenvolvem no ramo da gastronomia. Assim, aqueles que chegam até a localidade, vindos de veículos particulares, ônibus fretados, bicicletas e motos, têm oportunidade de curtir a natureza, com a oportunidade de saborear comida típica, como arroz com pequi, e pratos à base de peixes.
São elas, portanto, uma das grandes responsáveis pelo movimento no comércio. Cada uma com sua história de vida e acreditando no próprio potencial para contribuir no sentido de que Camisão se transforme em importante polo turístico. O presidente da Associação dos Moradores de Camisão, Cleomir Luiz Cristaldo, ressalta a importância desses estabelecimentos para o turismo:
— Há alguns anos, eram apenas barzinhos, de uma porta só, atendendo meia dúzia de gente tomando cerveja. Não tinha comida. Se chegasse àquela época aqui e pedisse algo para comer, mal você conseguiria uma mortadela — afirma.
Visão de futuro
Dois momentos de Neguinha: na pescaria (acima) e, na cozinha, com os filés de pintados
Acordar de madrugada, remar em sua canoa pelo Rio Aquidauana, dormir na cabana de lona que acha ‘’muito aconchegante’’, passar ao menos 15 dias pescando para fazer estoque e transformá-lo em seus famosos pratos para levar à mesa dos clientes’’ às sextas-feiras, sábados e domingos. Essa é a rotina de Eronildes Constant dos Santos, dona do Restaurante da Neguinha, desde 2019, no Distrito de Camisão, município de Aquidauana.
Márcia Mara, em frente ao estabelecimento
Na mesma via, batizada popularmente de Avenida Principal, mas cujo nome oficial é Demósthenes Martins (ex-prefeito de Campo Grande e ex-secretário de várias pastas do então Estado do Mato Grosso), um outro empreendimento é o de Márcia Mara Serra Ribeiro que não esconde seu entusiasmo de morar ‘’nessa maravilha da natureza’’, como denomina o distrito. Ela é proprietária do MN Restaurante, que inaugurou há três anos. Prefere falar sobre o futuro da região, do que das dificuldades. “Aqui é a terra do progresso’’, afirma.
Patrícia no comando da cozinha elaborando saborosos pratos
Ainda na avenida, Patrícia Alves comanda a cozinha no seu Sabor de Peixe onde, há três anos, transformou a conveniência do esposo Waldemir Oliveira dos Santos em um estabelecimento para receber clientes interessados em gastronomia diversificada à base de peixe. Situação hoje muito diferente quando atendia mais a comunidade local com sanduíches (pão e hambúrguer) e apenas o tão comum prato feito, com costela frita de pacu. ‘’A realidade hoje é diferente e muito melhor’’, afirma.
Dilcéia diz que ser comerciante ”está no sangue”
Apresentando-se como ‘’camisolense da gema’’ Dilcéia Vila Maior da Silva é neta e filha de tradicionais comerciantes do Distrito de Camisão. Proprietária do restaurante Águas do Paxixi, também na via principal, fala, com muita convicção, que não resta dúvida da importância turística da localidade, porém afirma que há necessidade de se fazer investimentos em infraestrutura para oferecer maior comodidade, segurança e acessibilidade nos atrativos oferecidos pela natureza e fonte de interesse dos visitantes.
Neguinha, a pescadora
As quatro empreendedoras tiveram como ‘’curso de especialização’’ apenas a visão de futuro quando decidiram dar uma guinada na rotina que mantinham nos praticamente últimos quatro anos. A Estrada Parque de Piraputanga foi um norte para tomar a decisão.
— Não me chame de Eronildes; aqui só me conhecem por Neguinha — afirma, sempre sorridente, a dona do restaurante. Casada com Adilson Ramos, ambos se dizem exímios pescadores. Hoje, porém, é ela quem se encarrega de trazer os peixes (das espécies pintados, pacu e jiripoca, principalmente) para servir à clientela que, a cada dia que passa, tem aumentado.
— Muitos turistas vêm de outros estados para conhecer os nossos pratos. Um prefeito de cidade do interior de São Paulo esteve aqui, com sua equipe e elogiou muito. Um argentino também veio aqui e disse que ia experimentar cada coisa do cardápio. Adorou o nosso pastel e o escondido, feitos de carne de peixe — conta. Disse ainda que uma cliente amiga levou um convidado que seria um xeque.
Alguns dos pratos oferecidos no Restaurante da Neguinha
Os antigos companheiros de pescarias pelo Rio Aquidauana — esposo, o filho Roger e o irmão Valmir Constant – hoje estão em outras funções: os dois primeiros são os garçons no restaurante e, o terceiro, é um exímio carpinteiro.
— Essas mesas e as cadeiras aqui do Neguinha foi ele quem fez e me deu de presente — diz ela.
— Na minha canoa eu levo todas minhas traias para ficar todos esses dias acampada — conta Eronildes que explica trabalhar à moda antiga, nada de molinete ou outro tipo de equipamento, e sim se utilizando da linhada de mão (linha com anzóis enrolada em uma garrafa). A isca que ela utiliza é a carne bovina’.
— Pacu gosta de carne de vaca — afirma, dando boas risadas.
Neguinha e o marido não têm dúvida que Camisão é uma região plena de desenvolvimento. Em 2019 decidiram deixar de viver da venda de peixes, para criar um restaurante. O que era uma vendinha onde Adilson comercializava salgadinhos para aumentar a renda de pescador, montada em um ‘’salão de 5×5’’, hoje é um amplo espaço com varandas na lateral e na frente, além da cozinha bem montada. E a ideia é ampliar ainda mais pois afirmam que a Estrada Parque de Piraputanga ajudou, em muito, no aumento do movimento.
Contribuiu para essa decisão de empreender em novo negócio o fato de ela ter conquistado o 1º lugar no concurso gastronômico da Festa do Peixe. O prato? Escondidinho de Jiripoca. Com o restaurante montado e o sucesso dos seus pratos, ela ganhou notoriedade e foi entrevistada para o programa da apresentadora Ana Maria Braga, da rede Globo. Recebeu também homenagem (em maio de 2022) na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul com a Comenda do Mérito do Trabalho Wilson Fadul, de autoria do então deputado Felipe Orro. Sempre sorridente, Eronildes afirma: ‘’Camisão é o futuro’’.
Do hambúrguer aos peixes
A visão de empreendedora de Patrícia Francisca Alves uniu o útil ao agradável para ampliar os negócios e conquistar renda maior. Com a Estrada Parque de Piraputanga totalmente asfaltada e atraindo cada vez mais os turistas para a região, ela decidiu colocar em prática, de forma mais acentuada, o prazer pela gastronomia. Assim, a tradicional conveniência ‘’Amigos do Vovô’’, de seu esposo Waldemir Oliveira dos Santos, transformou-se em Restaurante Sabor do Peixe.
— O aumento do número de clientes foi de mais de 80% — afirma.
Patrícia é campo-grandense e foi morar em Camisão há alguns anos para ficar próxima à irmã a quem, segundo ela, é ‘’muito apegada’’.
Conta que conheceu Waldemir e se casaram. Ele, há 16 anos era proprietário da conveniência batizada com seu apelido ‘’vovô’’. Ela conta que o marido desde os dois anos de idade era chamado assim na casa da família e o apelido acabou ‘’pegando’’.
Moquecas de pintado, pastel de peixe, peixe frito, filé ao molho de urucum, são alguns dos pratos do Sabor do Peixe
Como gostava de cozinhar e para auxiliar no rendimento familiar, Patrícia decidiu vender lanches e pratos rápidos a base de peixe frito, no estabelecimento do ‘’Vovô’’. Devido à estrada de terra e muitos buracos, a frequência ficava mais restrita aos moradores do distrito porque poucas pessoas passavam por Camisão em direção à Aquidauana, ou vice-versa.
Mas, segundo ela, há cerca de quatro anos a situação mudou completamente. A Estrada Parque de Piraputanga alavancou o empreendimento de Patrícia e Waldemir. Ela vislumbrou novos tempos e, junto com o marido, decidiu transformar a conveniência em um restaurante e, assim, surgiu o Sabor do Peixe. Daqui para frente, é ‘’continuar ajudando no desenvolvimento de Camisão’’, frisa.
A troca da Capital pelo interior
Depois de mais uma vez visitar Camisão para descansar dos dias agitados no restaurante que possuía em Campo Grande e onde servia comida caseira, no Jardim das Nações, Márcia Mara Sena Ribeiro conversou com o marido e decidiram mudar-se para o distrito e começar um novo empreendimento.
— Percebi que aqui (Camisão) tinha potencial. É uma região muito bonita e resolvi apostar em um restaurante à base de peixe. O meu marido fazia esses pratos em casa, para a gente mesmo. Hoje aqui no MN Restaurante e Conveniência ele é o cozinheiro. A parte administrativa e a de atendimento aos clientes ficam por minha conta — explica.
Seu estabelecimento ganhou fama pois a divulgação nas redes sociais e a ‘’propaganda boca a boca’’ contribuiu para que o movimento aumentasse. Além dos turistas que visitam o seu empreendimento, antigos fregueses de Campo Grande costumam comparecer para saborear seus pratos, como o peixe a urucum e o bolinho de bacalhau.
De pintado a molho de camarão a bolinho de bacalhau, o Restaurante MN a todos os gotos
– Começamos a atender em duas portinhas e, aí, fomos investindo devido a procura. Construímos esse varandão e colocamos mais mesas pois vêm muitos turistas de outros estados. Muita gente vem de cidades próximas e a Estrada Parque é rota dos grupos de ciclistas e motociclistas. Nós aqui atendemos de segunda a segunda-feira e servimos café da manhã, almoço e janta. Felizmente estamos contribuindo para gerar rendas.
Márcia afirma que espera investimentos do poder público, como a construção de uma praça para realização de eventos e outras melhorias para que os visitantes se sintam cada vez melhor,
— Uma coisa eu digo prá você. Sair daqui, nem pensar.
Volta às origens
Depois de morar 10 anos em Campo Grande e atuar em outras atividades, como salão de beleza, por exemplo, Dilcéia Vila Maior da Silva, voltou para Coronel Camisão onde passou a auxiliar a mãe que mantinha uma pousada e fornecia refeições para alguns visitantes, principalmente para quem vinha pescar.
— O comércio está no meu sangue, pois sou neta e filha de comerciantes. Eles sempre tiveram daqueles armazéns (fora da via principal) que forneciam todo tipo de mercadoria. Ajudava minha mãe e ela me ensinou a cozinhar.
Peixes fritos e ensopados de peixes fazem parte do cardápio de Dilcéia
Era, porém, um período difícil, segundo ela, pois o asfalto ligava Aquidauana a Camisão (pavimentação feita no governo de Pedrossian), mas quem vinha de Campo Grande, por exemplo, tinha que enfrentar muitos buracos na estrada de terra no sentido Piraputanga.
Em 2015, Dilcéia decidiu ‘’vir para o asfalto’’, ou seja, se instalar na avenida Demósthenes Martins, a Avenida Principal, criando o restaurante Águas do Paxixi onde prepara pessoalmente os pratos, tendo como fiel escudeira a filha Carol Acelita (na administração) e da ajudante Talia Pereira de Souza (nos fins de semana quando a casa lota). Dessa forma, o movimento aumentou ‘’100%’’. Seu tino para o negócio faz com que mantenha ainda uma mercearia e durante a semana fornece prato feito e marmitex para trabalhadores das obras dos empreendimentos imobiliários de Camisão. Ela defende melhorias para atender as necessidades dos turistas como pavimentação — com paralelepípedos, sugere — do acesso ao Mirante do Paxixi, bem como locais para estacionamento seja de veículos de passeio, como de ônibus, motos e bicicletas, além de serviço de limpeza visando preservar a natureza e por onde os visitantes passam. Uma preocupação que mostra seu interesse pelo desenvolvimento e preservação do meio ambiente.
— Quero sempre o melhor em todos os sentidos para a terra onde nasci — afirma.
‘’Nossa maior riqueza é o Rio Aquidauana e, a outra, é a Estrada Parque’’, diz presidente da associação
— Antigamente ninguém vinha aqui. Camisão e Piraputanga eram dois distritos não muito conhecidos.
O comentário é de Cleomir Luiz Cristaldo, presidente da Associação de Moradores de Camisão, distrito onde nasceu. Ele aponta como dois fatores de ‘’grande mérito’’ para que o local ganhasse visibilidade: A Festa do Peixe (no início de outubro) e a Festa do Pequi (começo de janeiro). Conta que foram buscar apoio junto ao poder público e foi quando houve a visita do então governador Reinaldo Azambuja.
— Foi ele quem realizou o nosso sonho ao asfaltar essa rota, dessa Estrada Parque. Aquele portal (na entrada do Distrito de Palmeiras) é novo. Aquela descida tinha muita terra, buracos, era um perigo. Reinaldo foi um baita de um parceiro para todos nós de Camisão e Piraputanga. Ele trouxe o progresso para cá. Nossa maior riqueza é o Rio Aquidauana; depois é a Estrada Parque — afirma.
Disse que, com a Estrada Parque, os eventos atraíram muitas pessoas que, também, passaram a ir, por exemplo, ao Mirante do Paxixi (Morro onde são celebrados até casamentos). São vários ciclistas, motociclistas, e outros visitantes que vêm passear e ‘’assistir’’ essa beleza, enfatizou.
Explicou também que a média de três mil pessoas que chegam ao distrito, de sexta-feira a domingo, aproveitam para um roteiro turístico na Cachoeira do Mirante, de quatro metros de queda, (de difícil acesso e não recomendada para mulheres e crianças), à Cachoeira do Morcego, que fica dentro do Rio Aquidauana e onde se pode descer por caiaque, e ainda ao Morro do Chapéu.
— O pessoal vem para conhecer nossos pontos turísticos e a nossa culinária. Camisão e Piraputanga, além das belezas naturais, são conhecidos pelo nosso peixe frito. Os preços não sangram o coração de ninguém — afirma.
Sobre a questão de hospedagem, ele diz que Camisão pode melhorar ainda mais. Explica que atualmente são quatro pesqueiros com quartos e uma pousada. Aponta ainda a necessidade de melhor acesso ao Morro do Paxixi, pois há dificuldades quando ocorrem chuvas e no período de seca, devido a poeira. Além disso, diz que é preciso de mais guias turísticos e ainda dotar o distrito de espaço para descarte de lixo. Defende campanha de orientação aos visitantes e divulgação institucional mais intensa.
— O Riedel (governador Eduardo Riedel) esteve aqui na época da campanha eleitoral, viu toda a realidade nossa e disse que ainda nos dois primeiros anos de sua administração, se eleito, iria asfaltar essa estrada que leva ao Mirante do Paxixi. Camisão, recebendo cada vez mais melhorias, com certeza será um dos importantes polos turísticos de Mato Grosso do Sul, atraindo visitantes de outros estados e turistas estrangeiros, como, aliás, já vem acontecendo — finalizou, entusiasmado.
Guia ”Coelho” lembra que antes do turismo, sobrevivência era pela pesca
— Nós sempre acreditamos que Camisão seria atração para turistas — diz o guia turístico Evaristo ‘’Coelho’’.
Ele nasceu e foi criado em Camisão e o ‘’Coelho’’ é um apelido que ele adotou, informalmente, como sobrenome.
— Fomos (os moradores) vendo que o distrito tinha tudo de bom para o turismo e aí com apoio da Prefeitura de Aquidauana o pessoal animou. Antes a gente sobrevivia da pesca. O pessoal era credenciado na Colônia de Pesca de Aquidauana.
Sobre Camisão, conta que a localidade foi grande produtora de banana e que chegava a mandar a fruta para Corumbá, por trem, até meados de 1983. Para ele, a perspectiva do turismo como fonte de renda traz alento para a localidade.
No Paxixi, segundo ele, são oito fazendas e há 12 hectares de plantação de piqui. Mas, o mirante e as cachoeiras no morro são os maiores atrativos para vislumbrar as belezas naturais.
— A minha Camisão é a terra do turismo. Eu acredito e tenho fé!